O
esmalte é o único tecido mineralizado de origem epitelial
Esmalte,
a estrutura que recobre a coroa dos dentes, é o tecido mais mineralizado do
organismo. Entretanto, diferentemente dos outros tecidos calcificados o mesmo
dos outros tecidos dentários, o esmalte é formado por células epiteliais
originadas do ectoderma. Além disso, quando totalmente formado e após a erupção
do dente, é o único tecido mineralizado completamente acelular, isto é, o único
que não mantém relação com as células que o formaram.
A
natureza cristalina do esmalte deve-se ao seu alto conteúdo inorgânico
A
extrema dureza do esmalte deve-se ao seu alto conteúdo inorgânico (97%),
representado por cristais de fosfato de cálcio sob a forma de hidroxiapatita,
com quantidades de carbonato, sódio, magnésio, cloreto, potássio e flúor, no
meio a 1% de material orgânico de natureza basicamente protéica, com escassos
carboidratos e lipídios, e por 2% de água. Essa composição faz do esmalte um
tecido extremamente friável, apesar de sua dureza. Por esse motivo, a dentina
subjacente, um tecido mais resiliente, confere sustentação e reduz a
possibilidade de fratura durante a mastigação. Embora a cor do esmalte varie do
branco-acinzentado ao branco-amarelado, sua estrutura quase exclusivamente
cristalina resulta em uma aparência translúcida. Quanto maior o grau de
mineralização do esmalte, maior é a sua natureza cristalina e, portanto, sua
translucidez. Isso influencia na cor do dente,
translucidez, juntamente com a delgada espessura do esmalte (máxima de
2,5mm da região dos vértices das cúspides e bordas incisais), permitem ver a
cor amarelada da dentina adjacente.
A
cor mais branca dos dentes decíduos, se comparados com os correspondentes
permanentes, deve-se à menor translucidez do esmalte. Todavia, os dentes
permanentes, quando recém-erupcionados, também exibem uma cor branca. Com maior
exposição na boca, o esmalte aumenta sua translucência, por causa da maturação
pós-eruptiva, deixando, portanto, aparecer mais a cor da dentina subjacente.
Desenvolvimento
(Amelogênese)
Os
ameloblastos passam por várias fases funcionais durante a amelogênese
As
células do epitélio interno do órgão do esmalte diferenciam-se em ameloblastos,
as células que formarão o esmalte. Entretanto, os pré-ameloblastos completam
sua diferenciação em ameloblastos só após a deposição da primeira camada de
dentina. Assim a formação propriamente dita do esmalte inicia-se durante a fase
de coroa. Isso significa que, desde a fase em que são células indiferenciadas
do epitélio interno do órgão do esmalte até que é completada a formação e a
maturação pré-eruptiva do esmalte, os ameloblastos passam por fases sucessivas
de desenvolvimento, as quais constituem o chamado ciclo vital. Essas fases, que
envolvem, portanto, o processo completo da amelogênese são: morfogenética, de
diferenciação, secretora, de maturação e protetora.
Fase
Morfogenética
O
epitélio interno do órgão do esmalte determina a forma da coroa do dente
Corresponde
ao início da fase de campânula, quando nas regiões dos vértices das futuras
cúspides (ou borda incisal) do dente as células do epitélio interno do órgão do
esmalte param de se dividir, determinando que a forma da coroa do dente seja
estabelecida pela dobra desse epitélio, devido ao seu crescimento diferencial
como um todo. As células até então se multiplicando por sucessivas divisões,
são cúbicas, com núcleo ovóide, grande e central, ou levemente próximo à lâmina
basal que as separa da papila dentária; o citoplasma possui numerosos
ribossomas livres, polirribossomas, mitocôndrias esparsas e complexo de Golgi
pouco desenvolvido, localizado na região adjacente ao retículo estrelado. Isso
sugere que nesta fase o material sintetizado pelas células do epitélio interno
é destinado principalmente a fins intracelulares, por exemplo, desenvolvimento
de organelas.
Fase
de Diferenciação
Com
a inversão da sua polaridade, as células do epitélio interno do órgão do
esmalte tornam-se pré-ameloblastos
Após
o período de divisão, as células do epitélio interno alongam-se, alcançando
quase o dobro da sua altura original. Desse modo, as células que inicialmente
eram cúbicas passam a ser cilíndricas. Coincidentemente, duas ou três camadas
de células achatadas aparecem nitidamente localizadas entre as células do
epitélio interno e o retículo estrelado, constituindo uma nova estrutura no
órgão do esmalte, o estrato intermediário. Com o alongamento da células do
epitélio interno ocorre inversão de polaridade: o núcleo fica localizado do
lado da célula próximo ao recém-formado estrato intermediário, constituindo o
novo pólo proximal, enquanto que o complexo de Golgi migra em sentido inverso,
ou seja, para o lado próximo à papila dentária, determinando por sua vez, o
novo pólo distal; desenvolvem-se também cisternas de retículo endoplasmático
granular, as quais orientam-se paralelas ao eixo longitudinal da célula. Esse
eventos coincidem com o aparecimento de um citoesqueleto bem desenvolvido,
constituído por numerosos microtúbulos orientados paralelamente ao longo eixo
da célula. Nesse estágio de desenvolvimento, com a nova disposição do núcleo e
das organelas, as células denominam-se pré-ameloblastos.
A
diferenciação dos pré-ameloblastos ocorre gradualmente, até tornarem-se
ameloblastos secretores
Os
pré-ameloblastos induzem a diferenciação das células da periferia da papila
dentária. Enquanto isso, o processo de diferenciação dos futuros ameloblastos
continua gradualmente, completando-se a diferenciação só após a presença da
primeira camada de matriz orgânica de dentina. A altura dos pré-ameloblastos
aumenta mais um pouco, tornando-se células cilíndricas altas, com
aproximadamente 30μm; o complexo de Golgi e o retículo endoplasmático granular
desenvolvem-se ainda mais. As mitocôndrias localizam-se, na sua maioria, na
região proximal. Inicia-se também a liberação de enzimas lisosomais através de
seu pólo distal, que degradam e tornam descontínua a lâmina basal. Ao mesmo
tempo desenvolvem-se numerosos e curtos porcessos na superfície distal, que se
projetam para a matriz da dentina que está apenas começando sua mineralização.
Esses processos dos pré-ameloblastos foram contatos com processos de
odontoblastos e com vesículas da matriz. Entre os pré-ameloblastos,
estabelecem-se junções intercelulares do tipo gap, desmosomas e oclusivo nos
dois pólos celulares, formando desse modo, os complexos juncionais proximais e
distais. Após esses eventos, os pré-ameloblastos tornam-se ameloblastos
diferenciados, prestes a secretar matriz de esmalte.
Fase
Secretora
Devido
à restrição da via intercelular, a formação do esmalte é exclusivamente
controlada pelos ameloblastos
No
início desta fase, o órgão do esmalte é constituído pelo epitélio externo, o
retículo estrelado, o estrato intermediário e os ameloblastos
recém-diferenciados nas regiões dos vértices das futuras cúspides e bordas
incisais. Entretanto, como a amelogênese começa nessas regiões e progride em
direção à alça cervical, existe um gradiente de ameloblastos, pré-ameloblastos
e células indiferenciadas do epitélio interno. No início dessa fase, todos os
componentes do órgão do esmalte ligam-se entre si através de junções
intercelulares (gap e desmosomas). Entre os ameloblastos recém-diferenciados,
as junções oclusivas dos complexos juncionais distais, já observados entre os
pré-ameloblastos, desenvolvem-se ainda mais, passando a constituir extensas
fileiras. Desse modo, a formação do esmalte, e sobretudo, sua mineralização são
reguladas exclusivamente pelos ameloblastos, devido a resultante restrição da
via intercelular.
No
início da fase secretora os ameloblastos possuem sua superfície distal plana
A
fase secretora marca o início da amelogênese propriamente dita: os ameloblastos
já possuem todas as características ultra-estruturais das células
sintetizadoras e secretoras de proteínas. O retículo endoplasmático granular,
constituído por várias cisternas, inicia a síntese de moléculas da matriz
orgânica do esmalte. Seguem-se, a condensação e o empacotamento do material no
complexo de Golgi, sendo posteriormente observados grânulos de secreção
envolvidos por membrana no citoplasma distal dos ameloblastos, contendo
material orgânico. Esses grânulos migram para o pólo distal e são liberados nos
espaços intercelulares e sobre a dentina do manto, que por volta dessa época
está consolidando seu processo de mineralização. Entretanto, as organelas estão
dispostas de maneira singular nos ameloblastos secretores: o retículo
endoplasmático granular é constituído por numerosas cisternas paralelas entre
si e alinhadas seguindo o longo eixo do ameloblasto, localizando-se distalmente
em relação ao complexo de Golgi, diferente do usualmente observado nas células
que sintetizam proteínas para exportação. A superfície distal dos ameloblastos,
nos primeiros momentos da fase secretora, é mais ou menos plana, apresentando,
porém, numerosas e curtas protrusões com aspecto de microvilos e invaginações.
A
matriz orgânica do esmalte é constituída por proteínas distintas das que
constituem as matrizes de natureza colágena
A
composição da matriz do esmalte é basicamente protéica, contendo carboidratos e
lipídios. Deve-se salientar que as proteínas dessa matriz não são de natureza
colágena, característica esta que a distingue da matriz dos outros tecidos
mineralizados e que expressa claramente a origem não conjuntiva do esmalte.
Classicamente são reconhecidos dois grupos de proteínas na matriz de esmalte
recém-secretada: as amelogeninas e suas isoformas, as mais abundantes e
hidrofóbicas, ricas em prolina e as enamelinas, que são fosfoproteínas
glicosiladas acídicas. Nos últimos anos foram identificados novos e vários
tipos de proteínas, sendo agora considerados, portanto, também dois grandes
grupos: as amelogeninas e as não amelogeninas. Neste segundo grupo incluem-se
fosfoproteínas glicosiladas acídicas – enamelina e tufelina – e glicoproteínas
sulfatadas – ameloblastina e suas frações, amelina e bainhalina.
A
mineralização do esmalte começa imediatamente após o início de secreção da
matriz orgânica. Entretanto, a mineralização inicial chega apenas até 15% do
total da matriz recém-formada, sendo, portanto, o esmalte jovem constituído
principalmente por componentes orgânicos. Os primeiros cristais de mineral, ou
seja, de hidroxiapatita, são depositados em contato direto com a dentina do
manto, que, neste estágio, forma uma camada mineralizada contínua. Assim,
forma-se inicialmente uma primeira camada mais ou menos homogênea de esmalte
com os cristais de mineral mais ou menos alinhados perpendiculares à superfície
de dentina. Por não serem observadas vesículas da matriz durante o início da
mineralização do esmalte, acredita-se quem sejam cristais de fosfato de cálcio
da dentina do manto os agentes nucleadores para desencadear esse processo no
esmalte, em associação com algum componente da matriz do esmalte. A esse
respeito , foi observado recentemente que a enamelina, pela sua característica
acídica, liga-se às fibrilas colágenas da dentina do manto mineralizada. Outros
estudos apontam para a capacidade da proteína tufelina como agente nucleador de
mineral. A interação entre as duas proteínas acídicas da matriz do esmalte
jovem, enamelina e tufelina, desencadearia, o começo da mineralização, ou seja,
a formação dos característicos cristais em forma de fita. Nesse estágio, as
moléculas de amelogenina se agregam formando pequenos glóbulos de 20nm de
diâmetro, denominados nanosferas. Estas alinham-se helicoidalmente, orientando
dessa maneira, o crescimento dos cristais de mineral.
Após
a deposição de uma delgada camada aprismática, os ameloblastos desenvolvem o
processo de Tomes
Como
consequência da deposição da primeira camada de esmalte, que nos dentes humanos
alcança ao redor de 30μm de espessura, os ameloblastos afastam-se em direção ao
estrato intermediário, desenvolvendo uma curta projeção cônica a partir do seu
citoplasma distal, o processo de Tomes. O aparecimento dessa nova estrutura no
pólo distal dos ameloblastos inicia a segunda parte da fase secretora, em razão
dessas projeções passarem a comandar a orientação do esmalte em formação.
Nas
regiões que contêm ameloblastos secretores, ocorre involução dos demais
elementos do órgão do esmalte
Enquanto
a camada de ameloblastos secreta ativamente e apresenta, no conjunto, sua
porção distal com aspecto serrilhado, devido à presença dos processos de Tomes,
os outros constituintes do órgão do esmalte sofrem também algumas modificações:
as células do estrato intermediário passam a exibir alta atividade da enzima
fosfatase alcalina enquanto o retículo estrelado perde parte do seu material
intercelular. Como consequência disso, a totalidade do órgão do esmalte, na
região correspondente à matriz em formação, sofre colapso, permitindo a
aproximação entre a camada de ameloblastos e o epitélio externo e, portanto,
entre os ameloblastos e o folículo dentário. Assim sendo, o folículo representa
a única fonte de nutrição, pois a dentina calcificada impede a passagem de
nutrientes provenientes dos vasos sanguíneos da papila dentária. Portanto, os
vasos do folículo dentário passam a constituir a fonte de nutrientes dos
ameloblastos para a secreção das moléculas da matriz e continuação do processo
de mineralização. Além disso, nesse estágio da amelogênese, vasos sanguíneos do
folículo penetram na região do retículo estrelado através de invaginações do
epitélio externo, chegando próximo ao estrato intermediário e aos ameloblastos.
A
formação do esmalte prismático ocorre através dos processos de Tomes
Após
o desenvolvimento dos processos de Tomes, os ameloblastos formam um esmalte
estruturalmente diferente, constituído pelo arranjo dos cristais de mineral em
unidades características denominadas prismas, devido à mudança na movimentação
dos ameloblastos durante a deposição da matriz e mineralização. Os processos de
Tomes contêm grânulos de secreção, vesículas, túbulos, lisosomas, fagosomas e
vesículas cobertas, bem como em algumas regiões, profundas invaginações da
membrana plasmática. Estabelece-se assim, um desenvolvido sistema
endosômico-lisosômico nos processos de Tomes. É através das pequenas
reentrâncias formadas na sua face plana secretora (superfície “S”) que ocorre a
liberação dos grânulos que contêm a matriz orgânica do esmalte; na face côncava
do processo (superfície “N”), não ocorre secreção. O estabelecimento do sistema
endosômico-lisosômico na porção distal do ameloblasto secretor, incluindo o
processo de Tomes, está relacionado com a liberação de enzimas, do tipo
metaloproteinases, entre elas a enamelisina (MMP-20) e a serinoprotease, para o
esmalte jovem, promovendo a degradação parcial e reabsorção de moléculas da
matriz. Com o avançar da secreção, os outros constituintes do órgão do esmalte,
ou seja, o estrato intermediário, o retículo estrelado e o epitélio externo,
completam seu colapso, passando a compor uma só estrutura constituída por duas
ou três camadas de células pavimentosas, que fica adjacente à camada
ameloblástica. Os processos de involução dos componentes do órgão do esmalte,
ocorrem, provavelmente, por apoptose.
Ao
finalizar a fase secretora, o ameloblasto não mais apresenta processo de Tomes
A
formação do esmalte, seguindo o padrão já descrito, continua até a deposição
das últimas camadas, após o que o processo de Tomes não mais está presente na
superfície distal do ameloblasto. Entretanto, mais algumas camadas podem ser
ainda depositadas, estabelecendo o esmalte aprismático superficial.
Fase
de Maturação
A
degradação e remoção da matriz orgânica permite o crescimento dos cristais de
mineral
Após
a deposição da fina camada superficial de esmalte aprismático, os ameloblastos
reduzem sua altura, diminuindo suas organelas relacionadas com síntese e
secreção, através de mecanismos de autofagia. Desse modo, os ameloblastos
mostram-se nessa fase de maturação, como células cilíndricas baixas,
apresentando sua superfície distal lisa ou com dobras, assemelhando-se neste
último caso, à borda estriada das células clásticas. Enquanto os primeiros
estão envolvidos na remoção de elementos orgânicos e água, os últimos
participam no rápido bombeamento de íons cálcio e fosfato para a matriz,
permitindo também o rápido crescimento dos cristais de hidroxiapatita. Além
disso, nesta fase, o alto conteúdo inicial de amelogeninas é reduzido através
da degradação, provavelmente, pela ação de metaloproteinases. Esse evento
parece ser importante para o aumento do componente mineral, já que as amelogeninas
em cultura inibem o crescimento de cristais. Os cristais minerais em forma de
fita, após o início da remoção de material orgânico da matriz, aumentam
rapidamente de largura em mais ou menos duas ou três vezes, enquanto sua
espessura aumenta mais lentamente, alcançando porém, dimensões uase oito vezes
maior que as iniciais. O aumento no tamanho dos cristais é acompanhado pela
fusão de vários deles, de modo que no início da fase de maturação existem
aproximadamente 1200 cristalitos por μm². A presença simultânea de dois grupos
de ameloblastos e sua alternância é responsável pelos eventos cíclicos de
remoção de elementos orgânicos e influxo de íons para a matriz. Contudo, com a
fase secretora, a fase de maturação também ocorre de modo centrífugo, Assim,
esta fase inicia-se nas camadas mais profundas e termina quando a superfície
externa é completamente mineralizada.
Esta
fase corresponde, na verdade, à maturação pré-eruptiva, pois uma vez na
cavidade oral, o esmalte sofrerá um processo de maturação pós-eruptiva.
Fase
de Proteção
O
epitélio reduzido recobre o esmalte maduro até a erupção do dente
Uma
vez completada a maturação do esmalte, os ameloblastos perdem a ondulação da
sua superfície distal, a qual torna-se definitivamente lisa. A altura das células
diminui ainda mais, o que as transforma em células cúbicas, que secretam um
material semelhante à lâmina basal localizada entre as células do epitélio
externo e o folículo dentário adjacente. Esse material é depositado sobre o
esmalte recém-formado. Todavia são formados hemidesmosomas que ligam os
ameloblastos essa lâmina basal.
Externamente a esta camada de células, os outros componentes do órgão do
esmalte, que já na fase de maturação mostravam-se francamente reduzidos, nesta
fase perdem por completo sua identidade. Estabelece-se assim, com a camada de
ameloblastos protetores, o epitélio reduzido do esmalte, estrutura que reveste
a coroa do dente até sua erupção na cavidade oral, separando-a do conjuntivo
adjacente. Esse epitélio reduzido contribuirá para a formação do epitélio
juncional da gengiva.
Caso
o epitélio reduzido perca a sua continuidade, o esmalte fica em contato com o
folículo dentário que rodeia o dente em erupção. Nesse caso pode haver a
reabsorção dessa área de esmalte através de odontoclastos ou deposição de um tecido mineralizado
semelhante ao cemento, a partir das células do folículo dentário.
Com
a exposição do esmalte na cavidade oral e o avançar da idade ocorrem
modificações químicas e estruturais. Essas midificações incluem perda de água,
diminuição do conteúdo orgânico e aumento da cristalinidade.
Estrutura
O
esmalte possui estrutura prismática
O
esmalte maduro tem a maior parte de sua espessura constituída por unidades
estruturais em formas de barras, chamados prismas. As zonas periféricas dessas
barras, chamadas regiões interprismáticas, completam a estrutura cristalina do
esmalte.
Prismas
Prismas
e regiões interprismáticas são determinados pela orientação dos cristais de
mineral
Os
prismas são barras ou colunas mais ou menos cilíndricas que se estendem desde a
estreita camada de esmalte aprismático, que foi depositada ao início da
amelogênese, até a superfície externa do esmalte. Entretanto, em algumas
regiões superficiais, os prismas são recobertos por esmalte aprismático. Os
cristais de hidroxiapatita densamente empacotados dispõem-se seguindo mais ou
menos o longo eixo do prisma. Entretanto, a exata orientação no sentido
longitudinal apenas se mantém na região central do eixo. Daí a periferia do
prisma, a orientação dos cristais muda, mostrando uma inclinação progressiva,
quanto mais próximo do limite do prisma. O encontro de cristais da periferia de
um prisma com grupos de cristais dos outros prismas adjacentes ou da região
interprismática, os quais tem orientação diferente, leva à identificação da
denominada bainha. As outras zonas do esmalte são, então, as regiões
interprismáticas nas quais cristais de hidroxiapatita apresentam-se também
densamente empacotados, preenchendo as zonas entre as regiões centrais dos prismas.
Embora há algum tempo acreditava-se no contrário, não existe diferença entre o
conteúdo mineral dos prismas e o das regiões interprismáticas, pois há
diferença apenas no que se refere à orientação dos cristais.
A
fase mineral do esmalte é constituída por cristais de hidroxiapatita de grande
tamanho
A
fase mineral do esmalte é constituído por fosfato de cálcio sob a forma de
cristais de hidroxiapatita com aspecto de barras hexagonais de 20 a 60 nm de
espessura e 30 a 90nm de largura, com comprimento variável. Apesar do seu
grande tamanho, possuem basicamente a mesma constituição daqueles encontrados
nos tecidos mineralizados de natureza conjuntiva, embora estejam embebidos em
uma escassa matriz orgânica em forma de gel, que ocupa apenas 1% do volume total
do esmalte.
No
esmalte maduro, algumas das proteínas remanescentes têm disposição preferencial
A
diferença entre prismas e regiões interprismáticas reside apenas da diferente
orientação e disposição dos cristais. Isso significa que a proporção de matriz
orgânica remanescente é similar em todas as regiões, embora as diferentes
proteínas tenham, em alguns casos, disposição diferencial. Um exemplo disso é a
presença de uma das glicoproteínas sulfatadas na região da bainha dos prismas,
por isso chamada bainhalina. Além disso, embora os prismas sejam considerados
barras com formato cilíndrico, eles não são retilíneos, apresentando leves
ondulações ao longo do seu percurso desde as proximidades do limite com a
dentina até a superfície externa. A disposição dos prismas é um pouco difícil
de compreender sem saber como eles se formam.
O
condicionamento ácido provoca no esmalte um desgaste superficial, formando
saliências e reentrâncias. Dessa maneira, formam-se regiões de microrretenção
cuja característica depende da orientação dos prismas.
Os
prismas são formados somente através da face plana do processo de Tomes
Apesar
dos processos de Tomes serem considerados projeções cônicas da porção distal
dos ameloblastos, eles possuem uma face ou vertente plana, enquanto as outras
são curvadas (côncavas). Quando um germe dentário é cortado seguindo uma
orientação paralela ao seu eixo longitudinal até se obter um corte vertical ao
limite amelodentinário na região das cúspides, pode ser observado que o vértice
do processo de Tomes não é localizado no centro, apresentando-se deslocado.
Mais próximo do lado da vertente plana. A vertente do outro lado é levemente
curvada, sendo que, após chegar até a base do processo, a curvatura volta a se
dirigir em sentido distal para s encontrar com a vertente plana do processo de
Tomes do ameloblasto adjacente. A superfície secretora do processo de Tomes é
representada apenas pela curta vertente plana (superfície “S”); a superfície
curvada da outra vertente não secreta (superfície “N”). Já quando os
ameloblastos são cortados também longitudinalmente, porém em ângulo de 90 graus
com relação ao corte anterior, as superfícies “S” encontram-se planas e
horizontais, sendo contornadas por curtas vertentes côncavas não secretoras, as
quais representam, a continuação das superfícies “N”.
A
disposição dos cristais que formam os prismas deve-se à direção da movimentação
dos ameloblastos durante a fase secretora
Durante
a deposição de matriz orgânica e dos cristais de mineral apenas através da superfície
“S”, os ameloblastos recuam contínua e centrifugamente seguindo uma direção que
forma um ângulo de 90 graus com o plano da superfície “S”. Por essa razão, os
cristais depositam-se adotando uma disposição paralela entre si apenas na
frente das superfícies “S”, ficando inclinados nas regiões correspondentes a
superfícies “N”. Estabelecem-se assim, respectivamente, os prismas e as regiões
interprismáticas. Os prismas são levemente ondulados desde a junção
amelodentinária até a superfície externa, razão pela qual diversos planos de
corte do esmalte resultam em aparência de “ferradura” ou orifício de
fechadura”. Além disso, a orientação dos prismas na região cervical dos dentes
decíduos é horizontal, enquanto nos dentes permanentes os prismas dessa região
são inclinados em sentido apical.
A
utilização de instrumentos rotatórios no esmalte provoca a formação de uma
camada amorfa denominada smear-layer recobrindo os prismas.
Estrias
Incrementais de Retzius
A
formação do esmalte segue um padrão incremental
Na
formação do esmalte ocorrem períodos de repouso, que se refletem na presença de
linhas incrementais de crescimento, estrias ou linhas de Retzius. As linhas
refletem a mudança de direção dos ameloblastos durante a formação dos prismas.
Após os períodos de repouso, os ameloblastos recomeçam a deposição de matriz,
com a consequente mineralização inicial, mudando levemente de direção. Dessa
maneira aparecem linhas que em preparações longitudinais de dentes desgastados
são escuras, dando a falsa impressão de serem hipomineralizadas.
Distúrbios
sistêmicos nas crianças podem afetar o processo de amelogênese, resultando em
períodos de repouso mais prolongados e, portanto, em estrias de Retzius mais
evidentes. Desse modo, a linha neonatal, que se forma por ocasião do
nascimento, constitui uma estria de Retzius acentuada
As
estrias de Retzius aparecem seguindo uma orientação oblíqua desde a junção
amelodentinária até a superfície externa, com exceção dos vértices das cúspides
e das bordas incisais, onde não atingem a superfície. Em cortes transversais,
as estrias de Retzius aparecem como anéis concêntricos que se assemelham ao
padrão das camadas dos tecidos do tronco de uma árvore. Em geral, a distância
entre as linhas incrementais de Retzius é muito variável, tendo sido observados
intervalos de 4μm a 150μm.
Estriações
Transversais
Os
prismas apresentam leves constrições transversais
Embora
os períodos de repouso na secreção do esmalte gerem as estrias de Retzius, em
algumas regiões de esmalte desgastado são observadas também leves estriações
que aparecem transversais em relação ao longo eixo dos prismas. Como
diariamente são formados aproximadamente 4μm de esmalte, essas estriações
transversais poderiam representar o ritmo circadiano na produção do esmalte pelos
ameloblastos. Entretanto, outras hipóteses têm sido formuladas sobre o
significado dessas estriações: micrografias eletrônicas de varredura às vezes
mostram leves constrições nos prismas, as quais poderiam ser observadas na
microscopia de luz como estriações. Por outro lado, pelo fato das regiões
interprismáticas estarem separadas por aproximadamente 4μm, prismas cortados
obliquamente poderiam ser observados como estriações transversais. Contudo, a
dificuldade em se obter cortes de esmalte devidamente orientados dificulta a
exata interpretação dessas estriações observadas nas preparações por desgaste.
Bandas
de Hunter-Schreger
As
bandas de Hunter-Schreger representam apenas um fenômeno óptico
O
trajeto sinuoso que os prismas seguem faz com que, quando observadas
preparações por desgaste em sentido longitudinal de dentes não descalcificados,
os prismas apareçam cortados em planos diferentes nas regiões onde ocorrem as
leves curvaturas. Assim sendo, ocorre desvio da luz incidente durante a
observação ao microscópio de luz, originando bandas claras e escuras, as bandas
de Hunter-Schreger.
Esmalte
Nodoso
Os
prismas entrecruzam-se nos vértices das cúspides
As
leves curvaturas dos prismas, que determinam seu trajeto sinuoso, não
interferem no arranjo nas superfícies laterais da coroa do dente nem nas
vertentes das cúspides. Entretanto, nas regiões dos vértices das cúspides,
alguns prismas entrecruzam-se irregularmente uns com os outros desde a junção
amelodentinária até a superfície externa do vértice da cúspide, constituindo
uma região chamada esmalte nodoso.
Tufos,
Lamelas e Fusos
Estruturas
sempre presentes no esmalte, originadas em diversas fases da amelogênese que se
detectam nas preparações de dente desgastado, principalmente em cortes
transversais.
Os
tufos do esmalte são áreas hipomineralizadas que contêm a proteína tufelina
Os
tufos do esmalte, possuem esse nome pela sua aparência que lembra tufos de
grama. Entretanto, na realidade são finas e curtas fitas onduladas que se
originam na junção amelodentinária alcançando no máximo um terço da espessura
do esmalte. Com as preparações por desgaste possuem espessura considerável, a
ondulação dessas áreas hipomineralizadas resulta na aparência de tufos.
Recentemente, uma proteína acídica foi identificada nesta região, chamada
tufelina.
As
lamelas são regiões hipomineralizadas que chegam até a superfície externa
As
lamelas são também áreas hipomineralizadas em forma de fita, porém, estas são
mais longas, alcançando frequentemente a superfície externa do dente. Por essa
razão, nas preparações por desgaste as lamelas parecem verdadeiras rachaduras
no esmalte.
Os
tufos e as lamelas representam áreas hipomineralizadas de esmalte,
possivelmente gerada durante os momentos finais da fase de maturação. Ambos
seguem a mesma direção dos prismas, sendo melhor observados em dentes cortados
transversalmente.
Os
fusos do esmalte são continuações dos túbulos dentinários
Os
fusos do esmalte originam-se nos primeiros momentos da amelogênese, na fase de
diferenciação. Quando os odontoblastos em diferenciação começam a secreção da
matriz orgânica da dentina do manto e a lâmina basal torna-se descontínua,
alguns dos seus processos penetram entre dois pré-ameloblastos em
diferenciação, invadindo, portanto, a região do futuro esmalte. Quando começa a
fase secretora, os ameloblastos secretam a matriz do esmalte que logo inicia
sua mineralização. Desse modo, forma-se esmalte em volta da extremidade mais
distal do processo odontoblasto. Assim, os fusos do esmalte não são mais que a
continuação dos túbulos dentinários. Os fusos são mais frequentes nas regiões
dos vértices das cúspides e seguem uma orientação perpendicular à junção
amelodentinária.
Estruturas
Superficiais
Microscopicamente
a superfície do esmalte é irregular
Regiões
mais ou menos lisas de esmalte aprismático alternam-se com outras nas quais é
possível distinguir a parte mais externa dos prismas e das regiões
interprismáticas com diversos graus de irregularidade. Observam-se algumas
depressões que correspondem ao local onde estava o processo de Tomes no final
da fase secretora. Além disso, na metade cervical detectam-se as periquimácias.
Periquimácias
As
periquimácias representam a parte superficial das estrias de Retzius
Nas
regiões cervical e média da coroa as estrias de Retzius terminam na superfície
externa do dente. Ao serem observadas externamente, correspondem a leves
depressões lineares no sentido horizontal, que causam leves ondulações na
superfície externa do esmalte. Essas linhas denominam-se periquimácias e são
mais acentuadas quanto mais próximas estão do colo do dente. As periquimácias
são fáceis de se observar no microscópio eletrônico de varredura, sobretudo em
dentes recém-erupcionados. Uma vez na boca. Com o desgaste funcional da
superfície do esmalte, as periquimácias tendem a desaparecer.
Esmalte
Aprismático
O
esmalte aprismático está presente tanto em dentes decíduos como em permanentes
Em
muitas regiões do esmalte superficial, os cristais não se dispõem constituindo
prismas ou regiões interprismáticas, mas formando uma camada de estrutura mais
ou menos homogênea (esmalte aprismático). Nesta, os cristais estão alinhados
paralelos entre sie perpendiculares à superfície externa. O esmalte aprismático
é formado por ameloblastos que não mais apresentam processo de Tomes.
O
esmalte aprismático está presente tanto em dentes decíduos como em permanentes,
embora nos primeiros constitua uma camada mais regular. Assim, nos dentes
decíduos recém-erupcionados a espessura média é de aproximadamente 7μm,
enquanto nos dentes permanentes varia de 4 a 5μm, podendo alcançar até 8 ou 9μm
em algumas regiões. Uma vez na cavidade oral, a espessura do esmalte
aprismático diminui devido ao desgaste funcional.
A
utilização de flúor de várias maneiras resulta em um esmalte mais resistente
devido à incorporação do flúor na estrutura do cristal de apatita.
A
placa bacteriana recobre praticamente todos os dentes erupcionados
Além
das estruturas superficiais formadas durante o desenvolvimento, o esmalte é
recoberto em praticamente todos os dentes erupcionados pela película adquirida.
Esta película é constituída por macromoléculas da saliva que aderem firmemente
à superfície do esmalte. A placa bacteriana forma-se na superfície do esmalte
devido a complexas interações entre os constituintes da saliva, principalmente
bactérias, que aderem firmemente à película adquirida, formando várias camadas.
Embora a estrutura da placa varie de acordo com a região do dente, basicamente
é constituída por um grande número de bactérias do tipo cocos, bacilos e
filamentos. Juntamente com esse conteúdo bacteriano existem filamentos de
polissacarídeos, macromoléculas de origem salivar e do sangue, íons e moléculas
menores. As bactérias estão organizadas em forma de microcolônias.
Durante
a mastigação ou mesmo pela escovação a placa bacteriana pode ser removida,
sendo que ela pode rapidamente se reformar. Deposição de mineral na placa
origina a estrutura chamada cálculo.
O
processo de cárie está intimamente relacionado com a presença de placa bacteriana
e resulta na destruição do esmalte através da desmineralização dos prismas.
Junção
Amelodentinária
Esmalte
e dentina relacionam-se através de uma superfície muito ondulada
A
superfície de contato entre o esmalte e a dentina subjacente, denominada junção
amelodentinária, é bastante ondulada, característica essa que garante o
imbricamento íntimo entre os dois tecidos dentários. Essa ondulação que
geralmente tem uma amplitude de 10 a 12μm, provém das leves concavidades da
superfície dentinária. Nesta região originam-se os tufos, lamelas e fusos do
esmalte.
Fonte:
KATCHBURIAN, Eduardo. Histologia e embriologia oral: texto, atlas, correlações clínicas. 3. ed. rev. e atual. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2012.
Obrigado por salvar o semestre
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